Publicado em 
A crise impulsionou a procura por modernização na construção civil. Iniciativas buscam trazer mais tecnologia à atividade – desde o planejamento até o acabamento final das obras – em um setor cujos métodos ainda são considerados “defasados”, de acordo com fontes da indústria.
“A queda após o ápice da construção civil fez as empresas reavaliarem suas operações e reposicionarem o volume de negócios visando a sustentabilidade”, avalia o diretor presidente do Centro de Tecnologia de Edificações (CTE), Roberto de Souza.
A CTE tem promovido desde o início de 2018 um núcleo de relacionamento, pesquisa e negócios chamado Rede Construção Digital. Reunindo representantes de toda a cadeia (fabricantes, projetistas, incorporadores e construtoras), o grupo pretende realizar pesquisas para identificar lacunas e disseminar soluções tecnológicas no mercado. “É um esforço setorial para discutir inovações e impulsionar o sistema construtivo. Além de promover a digitalização, essa rede gera negócios ao aproximar diferentes agentes da cadeia”, explica Souza. Fazem parte do núcleo mais de 30 empresas, entre elas a Basf, Cyrela, Deca, Eztec, Gafisa, MRV, Saint-Gobain, Samsung, Schneider e Thyssenkrupp.
O arquiteto de soluções da Schneider Electric, Marcos Felício, afirma que o objetivo é, através da troca de conhecimentos entre as empresas, promover o desenvolvimento do setor como um todo. “Identificamos que a construção civil está muito atrasada, ainda utilizando os mesmos métodos tradicionais há décadas.” Ele conta que o papel da Schneider é trazer a experiência da companhia em gerenciamento de energia e de internet das coisas (IoT). “A Thyssenkrupp, por exemplo, tem elevadores com IoT. Mas só ele isolado não significa nada. Nós conseguimos fornecer um sistema que o integra ao ar condicionado, sistema anti-incêndio, controle de acesso. As coisas têm que ser inteligentes, mas também trabalhar juntas.”
Para Felício, o maior entrave a esse tipo de aplicação não é o acesso às soluções, mas mudança de mentalidade do setor. “Temos toda a tecnologia disponível, mas ainda não faz parte da visão do mercado.”
O gestor executivo de inovação da MRV Engenharia, Flávio Vidal, concorda com o diagnóstico. “A construção é um segmento mais atrasado nessa questão de tecnologia. As discussões ainda estão no começo, é um setor mais conservador. Uma mudança de cultura das empresas não vai ocorrer do dia para noite.” Vidal destaca que o fato do ciclo da construção civil ser mais longo faz com que qualquer transformação seja mais demorada. “Em muitos casos, estamos falando de três a cinco anos do início ao fim de uma obra. Podemos estar discutindo agora uma mudança que só vai ocorrer no futuro.” O executivo da MRV diz que a empresa já se preocupava com inovações, mas vê o setor como um todo se movimentando após a crise. “É um desafio se abrir a possíveis erros ou a investimentos que não trazem resultados tão rápidos. Mas nesses momentos difíceis, é preciso pensar diferente. Quem não tiver essa iniciativa agora vai ficar muito para trás.”
Normas e financiamento
O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção (Abramat), Rodrigo Navarro, aponta que a inovação nos canteiros de obras não depende apenas da aplicação de tecnologia, mas também da conformidade técnica e fiscal e da capacitação da mão de obra. “Não adianta ter um equipamento inovador que não esteja em conformidade com as normas ou se o funcionário não é capaz de operar.” Ele acredita que o esforço setorial está ocorrendo, mas necessita também do apoio governamental. “O mercado não vai fazer essa modernização sozinho. Tem que haver estímulos, como linhas de financiamento. Nossa indústria está muito atrasada.”
Vidal destaca que a discussão sobre normas técnicas também afeta o financiamento do setor. “A linha do Minha Casa, Minha vida, feita pela Caixa Econômica Federal, tem uma séria de exigências normativas. No caso de uma inovação em que a norma não exista, é preciso criá-la, investir e desenvolver ensaios.”
Fonte: www.dci.com.br